O Museu e o Incêndio

O Paço de São Cristóvão, sede do Museu Nacional (MN) é tão intimamente ligado à identidade da instituição que, por ocasião do incêndio, as notícias davam conta da destruição de todo o acervo do MN. De fato, o prédio que se confunde com o museu, espaço de relevância histórica ímpar, consistia no coração da instituição, mas não encerrava a totalidade de seus espaços. O “palácio”, como carinhosamente os servidores do MN chamam sua sede, albergava áreas de ensino, pesquisa, guarda de coleções, setores administrativos e as áreas expositivas do museu, mas estas não eram as únicas.

O MN, em 2018, contava, na área do Parque da Quinta da Boa Vista, além do palácio, com uma estrutura adjacente: o Anexo Alípio de Miranda Ribeiro. Estas duas estruturas ocupam a área mais elevada do parque. Ao sul desta colina encontra-se o Horto Botânico, uma área de 40.748,50 m², com cerca de 20.000 m² de área construída, no qual além do espaço verde diferenciado, encontram-se os prédios da Biblioteca Central do MN, do Departamento de Vertebrados, do Departamento de Botânico, o prédio de ensino e algumas instalações dos Departamentos de Invertebrados e Antropologia. Estas edificações e instalações foram estabelecidas em momentos diferentes, mas convergem para um projeto reiterado ao longo do tempo que preconizava a construção de espaços adequados para os setores administrativos, de ensino/pesquisa e guarda de acervo, liberando o Paço para sua vocação como área expositiva, dedicada ao público, uma perspectiva que visava também à preservação da edificação histórica.

O incêndio de dois de setembro de 2018 concentrou-se no palácio, destruiu parte significativa do prédio e do acervo nele contido. Perdas incalculáveis e irreparáveis que, porém, nunca compreenderam a totalidade das coleções. O fogo também nunca atingiu o anexo, o que facilitou em muito toda a atividade subsequente da equipe de  Resgate de Acervos.

O sinistro teve proporções superlativas pela sua duração, intensidade, pela diversidade de coleções atingidas e pelas perdas irrecuperáveis de testemunhos da memória, história, cultura e ciência.

Em meio à destruição exaustivamente registrada e veiculada em todas as mídias, uma resistência era evidente, já no raiar do dia três de setembro: toda a estrutura externa do palácio permaneceu, ainda que delimitando áreas em  que drones e helicópteros mostravam vigas retorcidas e escombros. O telhado, só permaneceu nas áreas centrais do prédio e os pisos de cada andar foram completamente destruídos, salvo em seções do bloco frontal do palácio, nos quais foi possível recuperar parte do acervo que se encontrava em exposição.

O Museu hoje é administrado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e passa por um processo de reconstrução e reorganização depois do incêndio de 2018 – Fotografia de Drone, 2019

É importante lembrar que laboratórios e outras instâncias também foram destruídas, impactando seriamente na capacidade de resposta da instituição. Como manter as atividades, sem espaço, sem equipamentos, sem coleções? A resposta foi a solidariedade, interna e externa. Espaços no Horto Botânico foram compartilhados, salas foram cedidas em outras instituições, auxílios diversos contribuíram para a continuidade das atividades de ensino/pesquisa e para as ações com o público. 

Posteriormente, passamos a ter um novo espaço, bem próximo ao Parque da Quinta da Boa Vista, o atual Campus de Pesquisa e Ensino do Museu Nacional, uma área que já vinha sendo negociada para a construção dos novos prédios do museu, na expectativa de continuidade de seu projeto de reestruturação. É neste espaço que foram construídos os prédios para alocação temporária do acervo resgatado e onde estão hoje os espaços administrativos, o centro de visitação e algumas outras áreas de guarda de acervo.

Desde setembro de 2018 nossas expectativas de reestruturação foram transformadas em esforços de reconstrução. Seguimos firmes, todavia, nos mesmos princípios: excelência no ensino, pesquisa, na proteção a nossos acervos e na interlocução com o público.